Tudo é Perseguição
Texto por Thomas Toscano
A realidade é sempre uma só, ainda que cada um tente dar sua explicação. Quando contamos algo de nosso ponto de vista, é muito comum que façamos de tudo para omitir nossos defeitos e realçar ou até inventá-los nos outros. O general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, declarou em uma audiência que: “nações, entidades e personalidades estrangeiras” estão distorcendo dados sobre as queimadas no pantanal e na amazônia para derrubar o governo Bolsonaro.
Houve, é claro, a manifestação internacional repudiando o criminoso aumento nas queimadas deste ano, mas não só de fora vem protestos. A audiência na qual o ministro deu sua fala foi convocada justamente por três partidos de oposição (PT, PSOL e REDE), que acusam o governo de se omitir em ações de combate ao desmatamento.
Os dados falam por si. O governo destinou somente 67% do orçamento de 2019, ano do antigo recorde de desmatamento, para o Fundo do Clima. Além disso, apurações apontam que Ricardo Salles conseguiu passar a boiada durante a pandemia: gastou menos de 1% da verba que tinha para fortalecer as políticas de combate ao desmatamento.
Uma área de 300 hectares já virou cinza no pantanal, enquanto as autuações para fazendeiros que realizam queimadas ilegais caiu 48%. Chuvas estão previstas somente para o final de outubro e até lá, as estatísticas devem aumentar.
Nada disso vem de fontes conspiratórias ou da Grande Cúpula Globalista, como costuma acreditar a parcela mais ferrenha dos bolsonaristas. Os dados são de órgãos brasileiros e do próprio governo. A discussão de Augusto Heleno, porém, não se dá nos números catastróficos, mas em seus culpados.
Enquanto no ano passado se especulava que ONG’s comandadas por figuras públicas como o ator Leonardo diCaprio incendiavam a Amazônia, o fogo se alastrava. Enquanto o general e o capitão agora se preocupam em rebater críticas de países europeus e fundos de investimento, o fogo se alastra.
Para conter as queimadas não basta afirmar que “no século 18 a Europa queimou todas suas florestas” ou que “é natural haver queimadas no período de seca”. Nada disso apaga as chamas, querer ter razão não resolve o problema.
O governo, porém, agarra-se ao discurso de perseguição, como muitas vezes fazem os políticos acusados de corrupção. Porém, lhes pergunto: Tivessem agido corretamente, fariam toda essa manobra?
Somente pela ciência, como o general Heleno quis argumentar, não há dados o bastante que apontam ineficácia? Não há aumentos discrepantes que revelam infrações? O discurso perde força. Vira teoria da conspiração.
Se foi investido valores recorde, como afirmou o ministro, há a evidência de uma clara má administração de recursos, se não for coisa pior. A incompetência no controle ambiental não é questão política, nem questão de opinião: é de ação. E nada tem sido feito, ou cobrado, o governo tem sido omisso e agido tarde, quando já não se pode conter o fogo, como também disse Heleno. Aí fica fácil usar a ciência.
A cortina de fumaça que o general quis erguer não será maior que a que surge da Amazônia ou do Pantanal. A realidade é sempre uma só.
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